Comissão de Proteção ao Idoso

A recente alteração do artigo 49º da Constituição espanhola

Em Espanha procedeu-se a uma alteração do artigo 49º da Constituição (BOE-A-1978-31229) no sentido de consagrar um regime de proteção das pessoas com deficiência ou incapacidade em condições de igualdade com as demais e reconhecer o respeito pela sua autonomia.

Na redação anterior este artigo estabelecia o seguinte:

Artículo 49º

Los poderes públicos realizarán una política de previsión, tratamiento, rehabilitación e integración de los disminuidos físicos, sensoriales y psíquicos a los que prestarán la atención especializada que requieran y los ampararán especialmente para el disfrute de los derechos que este Título otorga a todos los ciudadanos.

 

No dia 17 de fevereiro de 2024 (BOE-A-2024-3099) esta redação foi alterada nos seguintes termos:

Artículo 49º

    1. Las personas con discapacidad ejercen los derechos previstos en este Título en condiciones de libertad e igualdad reales y efectivas. Se regulará por ley la protección especial que sea necesaria para dicho ejercicio.
    2. Los poderes públicos impulsarán las políticas que garanticen la plena autonomía personal y la inclusión social de las personas con discapacidad, en entornos universalmente accesibles. Asimismo, fomentarán la participación de sus organizaciones, en los términos que la ley establezca. Se atenderán particularmente las necesidades específicas de las mujeres y los menores con discapacidad.

 

O texto anterior correspondia à versão originária que foi introduzida no ano de 1978. O artigo 49º da Constituição referia-se aos diminuídos físicos, sensoriais e psíquicos. Por outro lado, embora fizesse menção à reabilitação e integração destas pessoas, os aspetos destacados eram o internamento e o tratamento.

A referência às pessoas diminuídas estava totalmente desatualizada em relação aos instrumentos internacionais nesta matéria, de que a Espanha é um país aderente, como a Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 13 de dezembro de 2006 e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Estava também desatualizada em relação às atuais conceções sobre as pessoas com deficiência ou incapacidade que são no sentido de privilegiar a capacidade restante e a promoção da autonomia no exercício dos direitos. Atualmente os princípios essenciais relativamente às pessoas com incapacidade são o princípio do reconhecimento da capacidade restante, em detrimento de uma abordagem centrada na incapacidade, e o princípio da intervenção mínima que promove a sua participação na sociedade em condições de igualdade.

A alteração do artigo 49º da Constituição resultou de um intenso movimento da sociedade civil que há mais de vinte anos reclamava a sua modificação e era uma das medidas que estava prevista na Estrategia Española sobre Discapacidad – 2022-2030.

Esta alteração foi aprovada com um amplo consenso político, tendo resultado de uma proposta conjunta que foi apresentada pelo PP e pelo PSOE e foi aprovada no parlamento espanhol com 312 votos a favor, muito para além da maioria de dois terços que era necessária.

A Lei nº8/2021 de 2 de junho (BOE-A-2021-9233) procedeu a uma alteração do regime civil das incapacidades em Espanha tendo alterado Código Civil (BOE-A-1889-4763) no sentido de um modelo idêntico ao regime do maior acompanhado que foi aprovado entre nós pela Lei nº49/2018 de 14 de agosto.

Pretende-se agora que ocorra uma modificação da política das comunidades autónomas no sentido do reconhecimento da capacidade restante das pessoas com deficiência ou incapacidade e da adoção de medidas para a promoção da sua autonomia e da melhoria da sua qualidade de vida.

Neste movimento destaca-se a Sociedade Galega de Geriatria e Gerontologia que aprovou a Carta de los Derechos de las Personas Mayores de Galicia – Por una Sociedad Inclusiva, Integradora y Respetuosa con las Personas Mayores. A sociedade galega é uma das associações mais prestigiadas no estudo e divulgação do envelhecimento e das pessoas idosas. A carta dos direitos das pessoas idosas consagra o direito a preservar a liberdade e autonomia e o direito a manter uma cidadania ativa numa sociedade que considera os desejos e as opiniões dos idosos. Trata-se de um documento que pretende influenciar os órgãos políticos, os organismos públicos e privados e a comunidade em geral para uma sociedade verdadeiramente inclusiva.

Cremos que a carta dos direitos das pessoas idosas é um bom exemplo de como as iniciativas da sociedade civil podem influenciar movimentos e levar a alterações tão relevantes como aquela que ocorreu com o artigo 49º da Constituição espanhola.